Apresentação
Profa. Rachelle Balbinot
(Editora / Revista Brasileira de Direito)
Prof. Eduardo Capellari
( Diretor Geral /
Faculdade Meridional)
Em 1968, poucos dias depois de atenuada a revolta estudantil, Hélène Cixous convidou Michel Foucault para participar da criação da Universidade de Vincennes (Paris VIII), juntamente com um grupo de intelectuais franceses reconhecidos (Serge Leclaire, Alan Badiou, Pierre Bourdieu, dentre outros). O episódio relatado dar-se-ia em um período rico da história mundial. Os anos sessenta foram pródigos na ousadia. Desconstituíram o mundo ocidental nascido do pós-guerra naquilo que lhe era mais caro: seus valores.
Afinal, os movimentos de massa dos anos sessenta reivindicavam mudanças substantivas, marcadas pelo signo da contestação aos paradigmas societários hegemônicos: um rotundo não ao liberalismo econômico e à concepção de uma modernização ascendente calcada em uma visão de progresso contínuo, amarrada ao processo de industrialização desenfreado; porém, também, um rotundo não ao marxismo ortodoxo e ao totalitarismo político, nascidos das experiências socialistas.
Os valores que configuraram a reconstituição dos significados políticos, como respeito ao meio ambiente, o respeito às diferenças culturais, raciais, sexuais, a busca de formas cooperativas e solidárias de desenvolvimento econômico, a emancipação feminina, dentre outros, nasceram nesse período. Portanto, o convite feito a Foucault era formulado em duplo sentido: fundar uma instituição de ensino superior e localizar geograficamente as iniciativas francesas de re-fundação do conhecimento, objeto central da universidade. Afinal, as ciências sociais, e mesmo as ciências naturais, pagaram o preço pelo apego insensato aos dogmas, às tradições, aos formalismos, nascidos de um positivismo avassalador.
A Revista Brasileira de Direito vem a lume, em seu primeiro número, do mesmo modo que o convite feito a Foucault, em um momento singular da realidade nacional. O Brasil completou duas décadas de redemocratização, produziu nas esferas municipais e estaduais alternância no poder, e na esfera federal a mais profunda mudança dos quadros dirigentes da história da República, completando o ciclo que se abriu ao final dos anos setenta do século passado. Afinal, a geração dos atuais dirigentes nacionais participou ativamente da contestação ao regime de 64 e foi responsável pela liderança do movimento de anistia aos políticos cassados pela ditadura, pela campanha das Diretas Já, pelo processo constituinte e, sinal do amadurecimento das instituições, pelo processo de impeachment do Presidente da República em 1992.
Porém, nossos crônicos problemas persistem. A falência da capacidade de investimento do Estado brasileiro, sua incapacidade estrutural em organizar políticas públicas universais e inclusivas, a degradação da esfera pública, o esvaziamento do fundamento ético do Estado como elemento civilizador, a sanha patrimonialista de nossas elites econômicas, demonstram que necessitamos aprofundar o processo democrático e reconstruir um projeto de nação.
Nesse contexto, a Revista Brasileira de Direito origina-se a partir de dois grandes objetivos. Em um primeiro momento, sob um cunho mais imediato, servir de instrumento de publicação e veiculação da produção científica e intelectual de professores, alunos e pesquisadores vinculados ao curso de graduação em Direito e cursos de pós-graduação lato sensu oferecidos pela Faculdade Meridional.
A Faculdade Meridional foi credenciada pelo Ministério da Educação através da Portaria nº 4.364, de 29 de dezembro de 2004, sediada na cidade de Passo Fundo, Rio Grande do Sul. Porém já havia iniciado suas atividades na área de pós-graduação em 2003, a partir de parceria estabelecida entre o Instituto de Pesquisa e Estudos Jurídicos com o Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina / CESUSC e aponta, após seu credenciamento, para um projeto de ensino superior mais ambicioso, qual seja, o de estruturar um centro de excelência em ensino, pesquisa e extensão na área de ciências sociais e aplicadas. Tal projeto vem avançando significativamente e consolidando a experiência necessária para seu prosseguimento.
Com isso, visualiza-se o segundo objetivo da Revista Brasileira de Direito, vinculado à sua proposta substancial. Na visão de seus dirigentes, a publicação objetiva concentrar esforços na publicação de trabalhos que contribuam para a renovação da dogmática jurídica brasileira, superando, da mesma forma que os cursos de pós-graduação lato sensu oferecidos pela instituição o tem feito, o isolamento estanque dos esforços teóricos de crítica e reflexão a respeito dos fundamentos dos institutos jurídicos brasileiros do momento de recepção e conhecimento dos elementos técnicos do direito. Portanto, haverá uma prática jurídica qualificada, na mesma medida em que esta estiver vinculada à reflexão sobre seus fundamentos, sendo iluminada pelos esforços teóricos e, via de mão dupla, com a prática problematizando o próprio sentido da teoria produzida por nossos juristas.
Por outro lado, ainda remetendo ao seu projeto editorial, a Revista Brasileira de Direito, assim como a instituição que é responsável pela sua publicação, coloca como desafio a interdisciplinaridade, partindo da compreensão, comum aos principais programas de pós-graduação stricto sensu da área jurídica no Brasil, que os problemas estruturais vividos pelo país, já aludidos anteriormente, mas especialmente aqueles vinculados ao funcionamento do sistema de justiça, aqui compreendido como o conjunto de instituições responsáveis pela efetividade do direito, passam, necessariamente pela abertura cognitiva e o diálogo com os melhores esforços teóricos protagonizados por outras áreas do saber.
Assim, expostas as razões de sua criação, agradecemos aos professores e pesquisadores que contribuíram com seus artigos para o primeiro número da Revista Brasileira de Direito, bem como aos membros do seu Conselho Consultivo pela sugestões iniciais. Desejamos longa vida à publicação que agora inicia sua caminhada solitária, e que seja permanentemente qualificada e fortalecida pelas sugestões e críticas de seus leitores.
Sumário
Diferenciación y desdiferenciación política en la modernidad y periferia de la sociedad moderna
Raúl Zamorano Farías / 13
Benjamin N. Cardozo: contexto e críticas à ortodoxia jurídica norte-americana
Denis de Castro Halis / 43
Homoafetividade e o direito à diferença
Maria Berenice Dias / 67
Cláusula gerel e segurança jurídica no Código Civil
Paulo Nalin / 85
Jurisdição constitucional: a concretização dos direitos de previdência e assistência sociais a partir do processo constituinte
José Ricardo Caetano Costa / 103
Os caminhos da justiça agrária no Brasil: um caso de engenharia político-constitucional
Marcílio Toscano Franca Filho / 129
A pós-modernidade e o constitucionalismo
Eduardo Capellari / 151
O princípio da subsidiariedade: fundamentos e perspectivas de seu uso na integração regional
William Smith Kaku / 167
O direito sob olhar socioeconômico: estratégias para uma ação conjunta
Everton das Neves Gonçalves, Joana Stelzer / 183
Dumping social
Roberto Di Sena Júnior / 197
Verdade, processo penal e garantismo
Leandro Porto da Silveira Neto / 213
A internet e o direito do autor: uma análise sobre a possibilidade de proteção dos direitos autorais no ambiente da rede
Salete Oro Boff / 231
A prevenção de riscos laborais e a defesa do meio ambiente no direito espanhol
Flávia de Paiva Medeiros de Oliveira / 247
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