Contracapa
O antissemitismo obsessivo de Hitler resultou, em grande parte, da crença de que os judeus contaminavam o mundo com comunismo; a Rússia de Stálin era, para ele, o centro do "judaico-bolchevismo" tão ameaçador e repugnante. Quando tropas alemãs invadiram a União Soviética, em 1941, travaram uma "guerra de aniquilação" inédita em sua ferocidade bio-militar. As Forças Armadas (Wehrmacht), sobretudo o Exército (Heer), eliminaram civis inocentes sob a desculpa de combater guerrilheiros; impuseram um tratamento genocida a prisioneiros de guerra; assassinaram lideranças soviéticas e até participaram do Holocausto judeu. Tais crimes depois causaram espanto nos Julgamentos de Nuremberg, ainda hoje sendo denunciados por intelectuais e exposições na Alemanha.
A presente obra contribui para tal discussão, apresentando uma série de documentos, traduzidos diretamente do alemão, que evidenciam o horror cometido pelo Exército teutônico na Europa Oriental. Desde diretivas assinadas por Hitler até panfletos para soldados rasos, passando por registros de discursos e reuniões, vários escritos comprovam o fanático anticomunismo nazi. Os marechais e generais do Terceiro Reich aceitaram violar o direito internacional. Emitiram papéis que, compilados neste livro, têm seu inestimável valor histórico-jurídico disponibilizado ao leitor.
Texto de abas
Em 1998 a polêmica Editora Revisão, fundada por Siegfried Ellwanger Castan – condenado por racismo pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul –, lançou "O Livro Branco alemão sobre os antecedentes da guerra contra a União Soviética". Nesta compilação, absolutamente tendenciosa, reproduz-se cinco documentos divulgados pelo Terceiro Reich em 1941 para justificar a agressão contra Moscou, com as típicas acusações sobre o expansionismo de Stálin, sobre violações do espaço aéreo alemão, sobre a espionagem e a propaganda subversiva da Komintern (Internacional Comunista)... Embora parcialmente verdadeiras, tais acusações, quando reunidas com o sectarismo de Castan, engrandecem Hitler como um herói mítico que atacou preventivamente para salvar a civilização cristã-ocidental.
O enfoque da compilação atual é, em vez dessa demagogia pública para as massas, o ocorrido nos bastidores da dita Operação Barbarossa. Mostra-se que a elite militar alemã, em diretrizes e panfletos, aceitou a terminologia do Partido Nazista ao conduzir a maior operação bélica da história, que combinou ódio ideológico, antissemitismo, racismo antieslavo e ganância imperialista. "Fuzilamento de comissários soviéticos – que eu saiba, não se encontra um momento na história das guerras, com exceção da sombria Antiguidade, em que instâncias tão altas tenham dado ordens dessa natureza", reclamou um tenente-general sobre seus superiores. Ele testemunhara a degradação da língua alemã, antes manejada por Lutero, Kant e Goethe, como ferramenta genocida sob a suástica. Tudo isso obedecendo à estrutura jurídico-legal de um Estado parcialmente fascista.
O momento é propício para estudar o impacto das ideologias na Idade Contemporânea. 2017 foi o ano em que se atingiu (e até se comemorou) os 150 anos da obra "O Capital", de Karl Marx, os 100 anos da Revolução Russa, os 50 anos da morte de Che Guevara e os 500 anos da Reforma Protestante, sendo emergencial destacar as barbáries que o homem pode cometer quando obcecado por utopias. O fato de a Rússia sediar uma Copa do Mundo em 2018, recebendo uma Alemanha reunificada pós-Guerra Fria, ressalta a importância da paz não apenas no futebol.
Prefácio
Samuel Schneider
Noutra obra, intitulada "A melhor colônia do mundo", abordei a invasão da União Soviética pelo Terceiro Reich sob uma perspectiva imperialista e geopolítica. Agora enfatizo a dimensão ideológica, ou seja, antibolchevique de tal conflito, examinando a truculência das Forças Armadas alemãs contra o primeiro Estado comunista do planeta.
Geralmente, as narrativas militares têm enfoque estratégico, descrevendo o uso de blindados, aviões e infantaria conforme a doutrina nazista da "guerra-relâmpago". Ganham destaque batalhas como Stalingrado, além da eficiência de generais como Erich von Manstein ao mobilizarem tropas em determinada paisagem. No estudo atual, todavia, aborda-se um assunto mais delicado: os crimes cometidos pela Wehrmacht na Europa Oriental, visando a "aniquilação" da União Soviética como sistema político. Lideranças do Exército Vermelho foram fuziladas; seus soldados, aprisionados aos milhões e então deixados para morrer de fome e frio; cidades soviéticas foram bombardeadas, e a população civil tiranizada por uma ocupação feroz que incluía retaliações em massa. Espantosamente, o Exército alemão também contribuiu, em vários casos, para o assassinato da população judaica soviética, inclusive mulheres e crianças, tolerando este que foi o genocídio mais abrangente e intenso da história humana.
Apesar de muito se falar sobre o nazismo no Brasil – às vezes, sem qualquer rigor intelectual –, pouca atenção é dada para as fontes primárias da era nazista. Eis o diferencial do presente estudo. Ele é uma compilação, em ordem cronológica, de documentos escritos pela alta cúpula nazista para nortear a luta na União Soviética, os quais traduzi diretamente do alemão para o português (algo talvez nunca feito antes). Explico a função desempenhada por cada um desses documentos, com apoio de farta bibliografia e inspirado em outras compilações, geralmente de língua inglesa.
Esforcei-me para preservar informações sobre minúcias administrativas e institucionais que provavelmente interessem, por exemplo, a estudiosos de assuntos bélicos. Além disso, enfatizei a dimensão jurídica de tais documentos, muitos dos quais foram usados nos Julgamentos de Nuremberg pelo Tribunal Militar Internacional como prova de acusação contra criminosos nazistas. Nesse sentido, enxergo o início de uma empreitada maior, pois leitores de língua portuguesa e espanhola poderão consultar as fontes primárias. O que viso é a cooperação multidisciplinar, envolvendo campos como Direito e História, com as traduções servindo de suporte para novos artigos, dissertações, teses e livros, ainda contribuindo para o conhecimento geral não-acadêmico.
Sumário
Notas do autor / 9
Prefácio / 11
Introdução / 13
O extremismo da "Operação Barbarossa" / 13
A atuação da Wehrmacht / 17
A importância dos documentos escritos / 22
1) Diretiva nº 21 "Operação Barbarossa", assinada por Hitler em 18 de dezembro de 1940 / 27
2) Discurso de Hitler na Chancelaria do Reich, em 30 de março de 1941, segundo anotações do general Franz Halder / 38
3) "Decreto sobre o exercício da Jurisdição Militar na zona 'Barbarossa' e sobre medidas especiais das tropas", de 13 de maio de 1941, assinado pelo marechal-de-campo Wilhelm Keitel / 44
4) "Diretrizes sobre o comportamento das tropas na Rússia", distribuídas pelo Supremo Comando das Forças Armadas em 19 de maio de 1941 / 53
5) "12 Mandamentos para a atuação dos alemães no Leste e o manejo
dos russos", assinados por Herbert Backe, do Ministério da Alimentação e Agricultura, em 1º de junho de 1941 / 60
6) "Diretrizes para o tratamento de Comissários Políticos", emitidas pelo Supremo Comando das Forças Armadas em 6 de junho
de 1941 / 73
7) "Aviso sobre a traiçoeira postura de guerra soviética", panfleto confeccionado pelo general Nikolaus von Falkenhorst em junho
ou julho de 1941 / 82
8) "Você conhece o inimigo?", panfleto de instrução confeccionado em junho ou julho de 1941 / 89
9) Memorando escrito por Martin Bormann, registrando uma reunião em 16 de julho de 1941, na qual Hitler e outros detalharam a ocupação do território soviético / 95
10) "Tratamento de civis inimigos e prisioneiros de guerra russos", ordem do Supremo Comando do Exército em 25 de julho de 1941 / 104
11) "Ordens sobre o tratamento dos prisioneiros de guerra soviéticos em todos campos de prisioneiros", do Supremo Comando das Forças Armadas em 8 de setembro de 1941 / 111
12) "Insurreições comunistas nas áreas ocupadas": ordem do marechal-de-campo Keitel em 16 de setembro de 1941, sobre a repressão contra guerrilheiros em toda Europa / 126
13) Ordem do general Alfred Jodl sobre o cerco à cidade de Leningrado, em 7 de outubro de 1941 / 133
14) "Conduta das tropas no espaço-leste", ordem do marechal-de-campo Walter von Reichenau, comandante do 6º Exército, em 10 de
outubro de 1941 / 140
15) Proclamação do comissário Hinrich Lohse para a população do Báltico, em 15 de novembro de 1941 /147
16) "Conduta dos soldados alemães no espaço-leste", ordem do general Hermann Hoth, comandante-em-chefe do 17º Exército, em 17 de novembro de 1941 / 153
17) Ordem do general Erich von Manstein, comandante do 11º Exército, em 20 de novembro de 1941 / 164
18) "Combate antiguerrilha": ordem de 26 de novembro de 1941, distribuída na zona do XXX Corpo de Exército / 173
Glossário de expressões e unidades das Forças Armadas
e da SS / 179
Notas de fim / 183
Bibliografia / 201
Fontes primárias / 201
Fontes secundárias / 203
Artigos e dissertações acadêmicas / 207
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